terça-feira, 26 de janeiro de 2010

BRAVA GENTE – TIDE HELLMEISTER



São Paulo recebe galeria de tipos inventados pelo artista, ilustrador e designer gráfico

Expressões de passageiros – do metrô, do ônibus e dos passantes das ruas de São Paulo – observadas por Tide Hellmeinster estão reunidas neste conjunto de 60 trabalhos: 58 pinturas e colagens acrílicas sobre papelão, da série Filhos de Deus, além de duas obras tridimensionais. Essa coleção de personagens nasceu quando o artista morava na Praça da Árvore, durante os percursos que fazia para ir trabalhar na região central da capital paulista. Depois, no estúdio, imaginava a vida de cada um e recortava, colava e pintava seus rostos – tristes, bondosos, malandros, egoístas, avaros, generosos, abatidos ou conformados – criando pinturas absolutamente originais.

Tide Hellmeister, que entre uma ampla e notável produção como artista e designer gráfico ilustrou a coluna Diário da Corte de Paulo Francis, faleceu em 2008, no início da concepção desta mostra, concretizada então pelos esforços do filho André e da curadora Claudia Lopes. Nesta série, a obra plástica, com a sua fatura inconfundível, é combinada com textos, também criados pelo artista, nos quais Elizabeth Lorenzotti colaborou na redação. As histórias imaginadas por Hellmeister, que acompanham cada pintura, são carregadas do tom tragicômico da vida real. Pedro, Cornélio, Julio Prosa de Jesus, João Benjamin, Eli Regina e tantos outros personagens ganham imagem e biografia, com direito a datas de nascimento e morte.

Brava Gente, patrocinada pela Caixa Econômica Federal chega a São Paulo depois de passar pela Caixa Cultural Rio de Janeiro, Salvador e Brasília. Aqui a mostra foi ampliada e seis das histórias poderão ser ouvidas por meio de telefones antigos em ambientação especialmente criada para cada uma das vidas inventadas pelo artista. Em comum, esses pequenos cenários trazem o clima da casa/ateliê de Tide. O catálogo (grátis), com projeto gráfico de Cláudio Rocha e André Hellmeister, textos do próprio Tide, da curadora Claudia Lopes, do designer Chico Homem de Melo e do músico Marcelo Coelho, traz 14 personagens e há um encarte interativo para cada um compor a sua própria capa.

Recortar, colar e pintar é a linguagem que constrói a obra polivalente de Hellmeister. “...cada colagem, pintura ou montagem parece ter sido feita no vórtice de um redemoinho mental e espacial que foi incorporando em seu trajeto, figuras, móveis, pedaços de paisagem, signos, letras...para compor um feitiço encantatório muitíssimo organizado e articulado no espaço plástico, sempre com ritmo, equilíbrio e acima de tudo coerência lírica”, escreve Carlos Soulié Franco do Amaral (Inquieta Colagem, Infolio Editorial). Na mesma publicação, o professor Chico Homem de Melo ressalta que, ao evocar uma herança barroca ao mesmo tempo em que faz conviver fragmentos de várias épocas e lugares, o artista inscreve-se na cena contemporânea.

MUITO TIDE, pela curadora Cláudia Lopes

Alguém me disse uma vez que as pessoas que mais se aproximam de Deus são os artistas... Com um botão, um pedaço de selo e algumas cores numa folha em branco, Tide criava um universo inteiro, incrível, fantástico e extraordinário. Compulsivo em permitir a passagem da luz, como num estrondoso choque de estrelas, propiciava o nascimento da vida-luz em suas obras. Ele não parava nunca, nem um só instante, de vivificar universos e personagens que nele habitavam. Certa feita me contou como nasceram os Filhos de Deus que originaram a mostra Brava Gente. Disse-me que trabalhou no centro de São Paulo e que, naquela época, morava na Praça da Árvore. Entre suas idas e vindas observava os “usuários” do Metrô. Então, impregnado de energias, cheiros e sons, em seu percurso diuturno, dava consciência aos Emílios, aos Nilos e aos Menezes que, com seus RGs e suas estórias povoavam, mais tarde, o imaginário de Tide, o seu mundo. E, assim como tantos que se acotovelam no Metrô, os Filhos de Deus também queriam sair: abrindo espaço com os cotovelos, iam se empurrando, se metendo num grande tumulto para que, um a um, pudessem passar mais rápido da idéia para as mãos de seu criador. Tinham pressa de vir a este mundo, como Tide também se apressava em trazê-los. Nosso mestre da colagem – e porque não dizer, também nosso mestre da pintura – trouxe à vida, além dos três filhos, mais de 5 mil trabalhos, alguns dos quais têm uma parte de sua alma e outros, sua alma toda. Hoje, Tide está em seu universo interior circundado por todos os amigos que fez e por aqueles que criou... Nós, no pseudo-exterior da realidade em que permanecemos, temos dele uma parte surrealista aparente e muito visível, que está conosco como um perfume bom, oriundo do privilégio que foi e é encontrar Tide Hellmeister.

TIDE HELLMEISTER (SP,1942 - SP,2008)

Paulista de 1942 estudou desenho e pintura com o pintor João Suzuki. Trabalhou como auxiliar de desenho e cenografia na extinta TV Excelsior, onde foi assistente do pintor e cenógrafo Cyro Del Nero. Foi colaborador da Masao Ohno Editora, onde executou livros de vanguarda como capista e programador visual, obtendo prêmio na Bienal do Livro do México de 1964. Participou de sua primeira exposição em 1963. Desde então desenvolveu uma obra múltipla. Trabalhou no projeto visual para a implantação do Jornal da Tarde. Recebeu os prêmios de melhor programador visual de 1973 e de melhor exposição de design gráfico na Pinacoteca do estado de São Paulo, em 2000, ambos conferidos pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). Foi diretor de arte do SESC, SENAC e da Federação e Centro do Comércio do Estado de São Paulo. Foi diretor e consultor de arte na Editora Abril. Criou e editou o jornal Arte-Afinal. Foi parceiro do jornalista Paulo Francis, ilustrando, por sete anos, sua coluna semanal Diário da Corte, nos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo. Colaborou com os principais órgãos da imprensa em São Paulo, com Estadão, Folha de S.Paulo, Gazeta Mercantil, e outros Estados. Nos últimos anos, trabalhava em seu atelier Collages, em São Paulo, onde prestava consultoria de design e artes gráficas.

Exposição: Brava Gente - Tide Hellmeister

Abertura: 30 de janeiro, às 11h

Até 28 de março de 2010, de terça a domingo - das 9h às 21hs

Entrada franca

Caixa Cultural São Paulo

Endereço: Praça da Sé, 111

Telefone: (11) 3321-4400